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segunda-feira, 18 de julho de 2016

AS FESTAS AMERICANAS EM BATAGUASSU

Muito ponche, salgadinhos, LP's de vinil girando numa radiola, conversa jogada fora, risadas e alegria. Essa era a tônica das festas americanas da Bataguassu da minha adolescência. Não sei se foi exclusividade da minha geração ou ioiô de modismos, mas foi algo viral na minha época de adolescente. E como ninguém é adolescente sozinho, quase todos se revezavam na organização dessas festas cobiçadas.
Embora não havia nada de negativo nesses eventos, nem todos os pais cediam espaço e tampouco permitiam que os filhos o apreciassem. A autorização dependia da cultura de cada família. Nem todos eram abertos para receber um monte de adolescentes em suas casas até a meia-noite. O horário não passava disso. Às vezes até menos.
Normalmente o espaço utilizado era a sala ou a varanda. Por mais que fosse algo ingênuo – comparado a muita coisa que vemos hoje – alguns pais a interpretavam como invencionice boba de jovem. Coisa de "gente rebelde que dita moda degradante para ferir a honra e a moral da família" (pensariam assim?!). Imagine se tais pais vissem uma balada regada a comprimidos de êxtase e cocaína como acontece tantas por aí, muitas vezes com consequências terríveis.
Mas voltando ao assunto, tais festas pediam organização prévia. O primeiro passo era um anfitrião (ou anfitriã) para recepcionar os amigos. Depois fazia-se uma lista de comes-e-bebes, e cada um dava um produto. Era só esperar pela noite. O ponche era preparado pelas meninas à tarde para que a bebida adquirisse uma delicada fermentação. Se feito na hora não tinha gosto. A fermentação branda das frutas emprestava um sabor especial à bebida, agravando o teor alcoólico. Mas como a quantidade de vinho era muito reduzida, ninguém ficava bêbado, por mais que as bochechas esquentassem. Apenas os salgados eram preparados por último.
O ponche era feito com vinho misturado em água, açúcar e pequena variedade de frutas picadas. Quase sempre se usava uva, laranja, maçã e abacaxi. Algumas pessoas eram cuidadosas e picavam em tamanhos minúsculos. Outras deixavam nacos imensos. Havia quem o preparasse de modo mais sofisticado, acrescentando champanhe, suco de laranja ou limão. A iguaria era preparada em caldeirões ou panelões grandes de alumínio. Na hora de servir, colocava-se em vasilhas mais apresentáveis, abastecendo-as à medida que iam sendo consumido. Alguns nem se importavam em servir ali mesmo no balde.
Ao lado da vasilha do ponche, sobre um prato, ficava uma concha usada para retirar a bebida. Às vezes disponibilizavam uma vasilha paralela, com gelo. Outros já despejavam o gelo assim que preparavam a bebida. Desse jeito quem vinha por último tomava uma espécie de garapa.

Outro atrativo da "festa americana" era os salgadinhos. Normalmente os participantes levavam bandejas com coxinha ou pastelzinho. Não passava disso. Algumas meninas – prendadas – faziam com muito capricho, outras deixavam a massa semelhante à sola de sapato, quando não, salgavam demais. Mas tudo se resolvia com um gole de ponche. O ponche era o principal de uma "festa americana", por isso se fazia em grande quantidade. Quem organizasse uma festa com pouco ponche passava vergonha. Lembro-me de uma festa em que flagrei um grupo criticando a anfitriã, suspeitando que a mesma havia ficado com parte das frutas e feito o ponche com a metade do que foi arrecadado.
Mas não acaba aí. A "festa americana" era uma desculpa para uma cidade sem danceteria. Não existia a “Badallus Club”. Na realidade, era como fazer da casa alheia a sua pista de dança, ou a sua discoteca, danceteria etc. Nesses embalos de sábado à noite as agulhas das radiolas sulcavam Olívia Newton John, Menudo, John Travolta, Pholhas, Bee Gees etc etc etc. Acontecia também de o participante chegar com um LP debaixo do braço. Nesse ponto a festa era bem democrática. Engraçado era quando um disco arranhado empacava exatamente na melhor música. Ficava repetindo um trecho até que alguém corresse até a vitrola e passasse para a próxima faixa.
Um detalhe curioso desses momentos descontraídos era o fato de o som não ser alto. As próprias radiolas nem permitiam o som explosivo como se vê nas baladas atuais. A vantagem era que isso permitia aos jovens dançar e conversar numa boa, sem gritar. Havia uma química saudável entre o som e a conversa. E obviamente não se incomodava os vizinhos.

Uma grande anfitriã de “festa americana” em Bataguassu foi a senhora Deise do Amaral Campos Prieto, a qual tinha uma mente jovem e acolhia a todos com simpatia e delicadeza. O interessante nesses momentos descontraídos era a aura familiar e saudável. Os pais – ou as pessoas mais velhas – permaneciam no evento com naturalidade, ocupados em algum afazer ou em ambientes mais reservados, assistindo TV.
E foi nessa "efervescência cultural" que muitos namoros surgiram. Alguns até findaram em marcha nupcial. Houve quem "fugisse" da festa americana para o início de uma vida conjugal. No outro dia as línguas tilintavam nos céus das bocas: "... a filha de fulano fugiu!"
Oh!
Mas, depois, tudo se resolvia. Muitos "casamentos fugidos" duram até hoje (creio), em detrimento de casamentos feitos nos moldes tradicionais, diluídos com o tempo. E também foi nessas festas que muitas amizades surgiram e se fortaleceram até os dias atuais.
Certo dia apareceu em Bataguassu a "Danceteria Badall'us Club" e pôs abaixo as festas americanas... não teve mais graça fazê-la. Quem iria concorrer com um espaço, moderno, jovem, e cheio de novidades?