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terça-feira, 28 de junho de 2016

DIVA CÂMARA MARTINS - AO LADO DE UM BOM HOMEM, UMA GRANDE MULHER


Ênio Barbosa Martins, L.C.F. e Diva Câmara Martis (Câmara Municipal de Batatguassu à ocasião da inauguração da Prefeitura Municipal)
Diz o imaginário popular que "por trás de um grande homem existe sempre uma grande mulher". Eu não acho. Considero meio esquisito sentenciar que deve ser "por trás de um grande homem".
Por que a mulher deveria estar "por trás do homem" se ela pode estar ao lado? 
Diva Câmara Martins é exemplo claro de uma grande mulher ao lado de um grande homem. Talvez nem todos pensem igual a mim, mas entendo que, mesmo com toda a dignidade de Ênio Martins - o primeiro prefeito oficial de Bataguassu - sua esposa teve uma história superior e mais marcante.
Enquanto ele foi gestor do município por alguns mandatos - e depois da vida pública tornou-se um cidadão comum - ela foi referência durante quase quase a vida toda. A história dela perpassou décadas de forma viva e pública, enquanto a do marido parou num determinado ponto.
Quando falamos de Ênio Martins, falamos do ex-prefeito, mas quando falamos de Diva Câmara Martins, falamos da professora. Só isso basta. E Diva era mais. Podemos enquadrá-la no rol dos educadores por excelência.
Enquanto escrivã, tabeliã e datilógrafa, se destacava pela fluência com que fazia as coisas acontecer.
Em seu lar, era espontaneamente uma bibliotecária. Possuía uma estante imensa com variados temas. Desde os clássicos da literatura brasileira e estrangeira aos assuntos mais avançados. Leitora voraz, possuía o raro dom da generosidade intelectual. Quem a procurasse com o objetivo de tomar-lhe emprestado algum livro, obteria êxito.
Sua casa era "centro de peregrinação" de pessoas curiosas, ávidas pelo conhecimento, pois era a historiadora de Bataguassu. Como pioneira deixou registros e acervos pictóricos preciosos. Tinha verve de escritora, deixando poemas e textos sobre os primórdios de Bataguassu, além de autora do hino ao município, dentre outros poemas.
Quando alguém não sabia um assunto, procurava nela a luz. Mesmo humana, ela era luz. Luz de hospitalidade, respeito e ensinamento a quem quer que fosse. 
Enquanto primeira-dama, se desdobrava, abnegada, em prol de fazer o milagre dos cobertores, do alimento e das roupinhas infantis para aquecer as crianças desfavorecidas. Fazia parte de diversos órgãos ligados à filantropia e possuía uma liderança inata.
Como gestora escolar, inspirou a muitos pelos modos metódicos, organização e capacidade de transformar o pouco em muito.
Fazia jus às palavras de Paulo Freire, quando ele diz que "nosso discurso deve estar em conformidade com a nossa prática" muito antes de sua obra ser tão divulgada. Educava mais pelo exemplo que pelas palavras, mas quando falava, tornava o horizonte do conhecimento mais amplo, e instigava novas descobertas.
Numa época que a datilografia era o "sonho impossível" de muitas moças bataguassuenses, haja vista significar um recurso didático/profissional avançado e caro - tal qual o computador há duas décadas - ela abria a sua casa e seu escritório para dar oportunidade a quem a procurasse. E as ensinava como quem ensina ao filho.
Quantos bataguassuenses aprenderam fazer ofícios, atas, memorandos, enfim documentos administrativos de todos os tipos com ela?
Hoje em dia, onde galpões e fundos de quintal viram universidades, podemos, sem sombra de dúvidas, reconhecer que a casa de Diva Câmara Martins foi a mini-universidade de sua época - e com o diferencial da qualidade do que era ensinado -  pois o Magistério - "sonho distante" para muitos bataguassuenses - fluía em sua casa. Era de sua mente e de sua Biblioteca particular que moças e moços encontraram os conhecimentos mais avançados. Não havia outra casa com maior biblioteca, nem com a disponibilidade que lhe era peculiar.  Não há como ignorar a notabilidade dessa mulher. 
Tempos depois, quando Presidente Epitácio/SP veio a se tornar uma referência para muitos jovens bataguassuenses, em termos de educação sistematizada, ela já o tinha sido bem antes, portanto foi precursora na busca pela formação de novos homens e mulheres bataguassuenses. Ela sabia que construia para o futuro.
Entendo que Diva Câmara Martins chegou a Bataguassu com uma missão: desenvolver missões.
Quantos profissionais de diversas áreas buscaram nessa fonte inesgotável de saber e bondade o modelo para sua vida futura?
Como eu disse no início, sem tirar o brilho de Ênio Martins, que era um homem reservado – mais para polido que para popular – nem por isso sem brilho próprio, Diva Câmara Martins roubou a cena despercebidamente e deu a Bataguassu sementes incontáveis, as quais germinaram e permanecem frutificando.
Não há como negar que ao lado de um bom homem pode existir uma grande mulher, e que, por sê-lo, pode construir histórias muito mais notáveis.
Quando estive em Bataguassu, recentemente, conversando com d. Kimie Kavanami de Lima, ela contou-me um fato lastimável, que fez-me corar de vergonha, mesmo sem ter culpa. Disse-me que alguns alunos (vejam a ironia) de uma determinada escola bataguassuense, passavam defronte à casa da grande dama da educação, Diva Câmara Martins, e dirigiam-lhe impropérios dos mais baixos. Ela, sentada em sua cadeira, na varanda, fragilizada e impotente pelo peso da idade, assistia o desrespeito em silêncio. 
Para mim foi uma pancada na alma, pois é inimaginável que alguém possa ferir tamanho monumento. Principalmente quem a conheceu. É como atacar um patrimônio. A propósito, pelo que tenho visto, parece que isso tem se tornado moda em Bataguassu, onde até as autoridades apagam a própria história. Isso é digno de uma tese.
O que pensar de uma juventude capaz disso? Não dá para acreditar que ignoravam a grandiosidade daquela mulher, mas se o ignoravam realmente, por que ofender uma pessoa idosa? Creio que os governantes devem convocar os jovens bataguassuenses, em massa, e reeducá-los junto com seus pais. Parece uma tarefa difícil, mas acredito muito em quem faz a diferença. Há tantas formas de se fazer isso.
Mas, finalizando, a lição que devemos tomar sobre Diva Câmara Martins é de uma pessoa que veio para ser útil. Para servir. Ela poderia também ter ficado em stand-by durante boa parte de sua vida. Mas escolheu estar sempre ligada a tudo e a todos. Que bom! Quisera que muitos sejam assim!